Pesquisadores do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Imar/Unifesp) – Campus Baixada Santista, liderados pela Dra. Aline Martinez, mapearam a linha costeira do estado de São Paulo, revelando dados inéditos sobre a urbanização das zonas costeiras do Brasil. O estudo, apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), foi publicado nesta quarta-feira (26) na revista científica Anthropocene Coasts e destaca a necessidade urgente de ações para uma gestão costeira sustentável e resiliente. No mesmo dia, um relatório público em português foi lançado com os dados em Santos, durante o 3° Fórum do Corredor Azul: Polo Cientifico e Tecnológico em Economia Azul, Porto e Logística (https://www.sympla.com.br/evento/3-forum-do-corredor-azul polo-cientifico-e-tecnologico-em-economia-azul-porto-e logistica/2498529?referrer=www.santos.sp.gov.br).
A pesquisa mapeou toda a linha de costa de São Paulo para quantificar a extensão de estruturas artificiais, como quebra-mares, espigões, cais de porto e píeres, e ocupações em zonas costeiras de baixa elevação próximas a praias e margens estuarinas. Essas áreas são altamente vulneráveis a eventos climáticos, sofrendo com o avanço do nível do mar, inundações e erosão.
A linha de costa está se tornando mais dura
A pesquisa revelou que o litoral paulista possui 245 km de estruturas artificiais na linha de costa, o que equivale a três vezes a distância entre São Paulo/SP e Santos/SP. Infraestruturas de proteção costeira, como muros de contenção, muretas, quebra-mares, e estruturas de atracamento de embarcações representam 80% de todas as estruturas mapeadas, sendo que 63% delas estão na Baixada Santista, a região mais urbanizada.
“Embora essas estruturas sejam úteis para nossas atividades diárias, elas causam grandes impactos ambientais, como a perda de habitats naturais e de biodiversidade, além de serviços ecossistêmicos essenciais,” explica a Dra. Aline Martinez. “Essas infraestruturas também facilitam a bioinvasão, quando espécies de uma região se estabelecem em novas localidades, causando problemas ambientais e prejuízos econômicos”, completa a pesquisadora.
Riscos das ocupações em áreas vulneráveis
O estudo também revelou que mais de 300 km da costa paulista têm ocupações humanas em áreas vulneráveis: 235 km perto de praias e 67 km próximos a manguezais e margens estuarinas. Isso significa que mais de 25% da linha costeira “mole” do estado possui populações
humanas e infraestrutura urbana em áreas altamente suscetíveis a riscos climáticos. A pesquisa ainda mostra que 55% da extensão de praias do litoral de São Paulo possui áreas urbanizadas dentro de apenas 100 m de distância da faixa de areia. Na Baixada Santista e no Litoral Norte, esta cifra sobe, respectivamente, para 81% e 74% das praias.
“Manguezais e vegetações como as restingas são nossa primeira linha de defesa contra o impacto das ondas e o avanço do mar. Com as mudanças climáticas, preservar essas vegetações é crucial para proteger cidades costeiras, pessoas e atividades econômicas”, explica o Dr. André Pardal, coautor da pesquisa. “Projeções indicam que praias podem recuar até 100 m até o fim do século devido ao aumento do nível do mar e à erosão. O intenso processo erosivo já observado em Ilha Comprida/SP, por exemplo, pode se tornar comum em todo o litoral paulista nas próximas décadas,” acrescenta Pardal.
Ações necessárias
“Exceto nos municípios do Litoral Sul, as áreas em frente às praias estão altamente urbanizadas no resto do estado. Precisamos de planos e ações eficazes para preservar os manguezais e restingas remanescentes e restaurar áreas alteradas”, comenta o Prof. Ronaldo Christofoletti. “No contexto dos debates sobre a PEC das Praias, nosso estudo enfatiza a necessidade de fortalecer a preservação dos Terrenos de Marinha e seus acrescidos, ao invés de facilitar suas ocupações,” completa Christofoletti.
Os resultados mostram que a urbanização costeira é uma fonte significativa de impacto ambiental e riscos costeiros em São Paulo e no Brasil. A pesquisa ressalta a importância de ações eficazes para mitigar esses impactos e promover um desenvolvimento costeiro sustentável. Em particular, o estudo alerta para as ameaças de alterações em leis que facilitem a ocupação de áreas costeiras altamente vulneráveis às mudanças climáticas.